Lagos salinos do Pantanal.


Lagos salinos do Pantanal derivam de processo químico atual

Estudos recentes de cientistas da USP, da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), do Institut de Recherche pour le Dévelopement (IRD), da França, e da University of California-Riverside (UCR), EUA, revelam que as águas salgadas das lagoas do Pantanal Nhecolândia, uma sub região do Pantanal Matogrossense, resultam de processos geoquímicos atuais.

         Complexo de cerca de 27 mil quilômetros quadrados concentra 1.500 lagoas salinas
Hipóteses anteriores consideram que a salinidade das águas teria sido causada por processos vigentes durante climas mais áridos do passado. “De acordo com estudos clássicos da década de 1980, isso teria ocorrido entre 126 mil e 10 mil anos atrás, no período Pleistoceno Tardio, quando as altas taxas de evaporação, características de climas mais secos, concentraram naqueles locais elementos como potássio, sódio e magnésio”, conta a geógrafa Sheila Furquim, que integrou a equipe de pesquisadores como aluna de doutorado do Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP. Mais tarde, de acordo com esta hipótese, o clima foi ficando úmido e algumas partes foram atingidas pelas águas doces. As lagoas salinas teriam surgido em locais onde a salinidade foi preservada, sendo então, relíquias deste período mais seco.
         
Desde 1998, os pequisadores das quatro instituições vêm estudando os aspectos geoquímicos das águas e solos relacionados a estas lagoas. O Pantanal da Nhecolândia, local de concentração das lagoas salinas, fica no centro–sul do Pantanal Matogrossense e é delimitado pelos rios Negro e Taquari. Sheila descreve que as lagoas de águas salgadas são facilmente reconhecidas, mesmo em imagens de satélites. “Elas têm uma forma arredondada ou oval e possuem, em geral, uma faixa de praia que fica bem visível durante a época de seca.” Em todo este complexo, de cerca de 27 mil quilômetros quadrados, existem aproximadamente 1.500 lagoas salinas e outras cerca de 7.800 de água doce, as chamadas baías.

No Pantanal Nhecolândia existem áreas mais altas, as chamadas cordilheiras, e as mais baixas, conhecidas como vazantes. “É justamente nas cordilheiras que se encontram as lagoas salinas”, diz Sheila. Nas vazantes, que estão há cerca de 2 ou 3 metros mais baixas que as cordilheiras, estão localizadas as lagoas de água doce. “Durante as cheias, estas lagoas doces unem-se umas às outras por fios d´água, formando rios temporários”, descreve. As lagoas de água salgada distam em média 500 metros (m) das lagoas de água doce.

Origem das águas salinas
As águas das lagoas salinas, localizadas nas cordilheiras, segundo a pesquisadora, são abastecidas pelo lençol freático. “Não há nenhum aporte de água superficial. A quantidade de água nestas lagoas aumenta ou diminui de acordo com a oscilação do lençol”, afirma.


Apesar de os estudos clássicos apontarem processos passados como as causas para a origem das águas salgadas, Sheila lembra que as pesquisas da época não eram tão detalhadas. “Não se trata de se questionar a qualidade ou competência dos estudos, mas as ferramentas não eram como as atuais”, esclarece.
Ela conta que um dos estudos recentes, liderados pelo francês Laurent Barbiero (IRD) e pelo professor José Pereira de Queiroz Neto, do Departamento de Geografia da FFLCH, aponta que as águas dos dois tipos de lagos (doce e salgado) são quimicamente da mesma família, e que as diferenças poderiam estar ocorrendo atualmente pela precipitação de íons, devido à alta evapotranspiração que atinge o Pantanal (1.400 mm/ano).
Segundo os estudiosos, as águas salgadas teriam maior concentração de íons de magnésio, potássio e cálcio, em relação à água doce. E mais, que a água salgada derivaria da evaporação da água doce em tempos atuais, mas por ligações subterrâneas.
Sheila analisou amostras de sedimentos e solos localizados abaixo de uma lagoa salina e confirmou a hipótese apontada pela equipe liderada por Laurent. “Durante a seca, a água subterrânea é isolada nos arredores da lagoa salina por camadas de solos impermeáveis. É quando ocorre a precipitação dos íons de magnésio, potássio e cálcio”, explica.
Nas amostras, os cientistas encontraram minerais do tipo calcita, esmectitas ricas em magnésio, típicas de ambientes de alta evaporação, e micas, típicas de ambientes hipersalinos. “A formação atual da esmectita explica a saída de magnésio da água e a mica explica a saída de potássio. Há ainda a calcita, que explica a saída do cálcio”, ressalta Sheila. Desta forma, a salinidade das águas do pantanal deve-se, ao menos em parte, à formação atual destes minerais, e não a processos ocorridos no passado. Ela lembra que as lagoas salinas podem atingir pH 10, extremamente alto, e que têm importância para o abastecimento da fauna e do gado local.
Por Antonio Carlos Quinto - acquinto@usp.br

Fonte: http://www.usp.br

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